Translate tool

terça-feira, 8 de março de 2011

Audições na OSB 2

Posto aqui a resposta à carta aberta de Alex Klein por John Neschling em seu blog Semibreves.

"A deselegância de Alex Klein

Como sabem meus leitores, uma das razões pelas quais criei esse blog foi a minha decisão de não permitir mais que ataques me sejam feitos sem que eu possa me defender. Hoje, li a carta aberta que o oboísta e atual maestro Alex Klein enviou ao maestro Roberto Minczuk, em razão das audições marcadas para os músicos da Orquestra Sinfônica Brasileira. A carta é de uma deselegância ímpar em relação a mim e também ao maestro Minczuk, a quem Klein se dirige como se fosse um veterano na regência. Alex Klein é um excelente músico, mas jamais fez nada parecido ou próximo do que deixei realizado no Brasil. Sua passagem pela direção do Teatro Municipal de São Paulo foi fugaz e estéril, e nem por isso ele foi vítima da deselegância que hoje ele utiliza  na sua tentativa de ser parceiro de outro maestro, e ao mesmo tempo partidário dos músicos da orquestra.
Comparar as atuais audições da OSB com as que realizei  durante a minha gestão frente à OSESP  é fora de propósito. As audições foram feitas com outros critérios, outros objetivos e  e sobretudo,  após longas negociações com a comissão da orquestra e a anuência da grande maioria dos músicos. Sem falar que elas foram programadas no início da minha gestão.
Alex afirma que essas audições deixaram cicatrizes profundas, que até hoje afetam os músicos. O que elas deixaram, sim, foi uma orquestra que, com menos de  dez anos de trabalho, já estava ganhando o Grammy. Quando saí da OSESP  a prestigiosa revista inglesa Gramophone a incluiu como digna de nota na matéria sobre as vinte melhores orquestras do mundo.
Curioso Alex mencionar o cenário internacional das orquestras para discutir o contexto brasileiro. Como se o Brasil, em 1997, tivesse a mesma tradição e os mesmos 150 anos de história da Filarmônica de Berlim nas costas. Quando cheguei ao Brasil, em 1997, Alex era oboísta da orquestra de Chicago porque no Brasil não havia orquestra à qual ele pudesse entregar seu talento. Naquela época, para quem não se lembra, os músicos da OSESP, ensaiavam num restaurante e podiam até mesmo ler jornais durante os ensaios. Mais do que construir uma orquestra, eu imprimi uma cultura de qualidade e de disciplina, e se fiquei com a pecha de autoritário e ditador, foi por conta de atitudes deselegantes e conservadoras como a de Alex, que na época em que fui diretor da OSESP, ia a meu camarim dizer coisas muito diferentes do que diz hoje em carta aberta.
Dizer que em 1882 os músicos da Filarmônica de Berlim iniciaram a sua luta por melhores condições de trabalho  é citar exemplos fora da nossa realidade.  A OSESP reestruturada não tem nem 15 anos.  Klein parece que esqueceu disso e vem agora com exemplos de 1882. Durante toda a minha atuação à frente da OSESP minha preocupação não foi só quanto à qualidade artística. Enquanto Alex Klein tocava nos USA e ganhava em dólares, sem pensar em voltar ao Brasil, eu batalhei pelo aumento dos salários dos músicos brasileiros em reais e para dar-lhes uma condição de trabalho digna e luxuosa, comparável a qualquer grande orquestra do mundo, inclusive a de Chicago, onde Alex tocava.  Quando deixei a OSESP estava iniciando uma batalha para conseguir um plano de previdência privada para os integrantes da Fundação OSESP e havíamos incluído o seguro saúde nos seus salários. O que fez Alex Klein pelo músico brasileiro?
Nesse episódio da OSB, me manifestei a favor da orquestra e coloquei meu blog à disposição para a divulgação das ideias da Comissão dos Músicos. Posicionei-me em relação à crise, da mesma forma como venho comentando a realidade de diversas  outras orquestras da América Latina.
Citar grandes empresas e comparar suas políticas  administrativas à gestão  de uma orquestra sinfônica, como faz Alex,  é típico de quem nunca fez nada no campo da gestão artística além de pequenas empreitadas regionais . Uma orquestra não produz suco de laranja, petróleo nem aviões, e seus músicos não devem ser encarados como burocratas ou fornecedores. Sempre me bati contra essa mentalidade reducionista. Antes de mais nada, porque uma orquestra não dá lucro. Seus ganhos são mensurados por critérios muitos diferentes.
Ainda por cima citar como exemplo a EMBRAER, que há pouco tempo promoveu uma demissão em massa, é desconhecer até os modelos de gestão das grandes empresas contemporâneas. Nunca fui partidário de demissão aos magotes . (Ah, sim, na verdade houve o episódio da demissão dos sete músicos que brigaram e desrespeitaram Roberto Minczuk, na época, meu assistente, durante um ensaio, e a quem apoiei no episódio, assumindo todas as responsabilidades que me cabiam).
Alex vai mais longe e sugere que eu não tenho carreira internacional. Se ele ignora o que venho fazendo fora do Brasil durante os últimos 40 anos, razão pela qual, inclusive fui chamado de volta ao Brasil –  não por razões de saúde que me impediam de continuar no meu emprego – devia, no mínimo, calar-se a meu respeito. Diferente dele que é regente só recentemente,  atuo nessa profissão  desde os meus vinte anos . É curioso que ele queira ser agora o paladino dessa classe, espinafrando colegas, pretendendo dar aulas a Roberto Minczuk  e, pretensiosamente, ditando regras que ele nunca conseguiu por em prática. Seu primeiro conflito no único cargo importante que tentou ocupar como diretor de  um grande teatro, resultou na sua demissão depois de tres meses no posto.
Nessa carta, Alex, ainda que de forma indireta, dá a entender que, como Minczuk agora na OSB, eu agi na Osesp numa atitude de desrespeito e contrária aos interesses dos músicos, e esse é o maior disparate que ele diz nessa carta que até músicos de Montevideo já receberam.
Agora é fácil para o Alex falar nos avanços das orquestras brasileiras, e nas conquistas que conseguimos. Mas é preciso ter em mente que a história é feita de coragem, originalidade e sobretudo , senso crítico. Se hoje músicos da qualidade de Alex podem voltar a viver no Brasil, como fez ele próprio- e  Minczuk não é obrigado a ficar só em Calgary-,  é porque fui um pioneiro na criação de uma nova realidade sinfônica no país.
Como disse Sêneca, nossa vida é curta e nossa arte é longa. A essa altura, Alex deveria, no mínimo, ter uma biografia como a do maestro Minczuk ou a minha, para escrever  cartas pretensiosas como a que escreveu."

Nenhum comentário: