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domingo, 26 de fevereiro de 2012

Carnaval em Bellinzona

Imagens de uma festa muita bacana, com coreografias e fantasias bem feitas.

















sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A revolta, por Humberto P. Charles

O texto não é meu e ponho entre aspas. Meus comentários aqui são somente pra dizer que achei o texto esclarecedor, preciso e direto. Segue:

"“ATEUS REVOLTADINHOS”

 
Se tem uma coisa que todo ateu já ouviu uma vez é que ele é revoltado. Que ele é nervoso ou rancoroso. Alguns religiosos justificam essa “característica” como sendo oriunda do fato dele “não ter deus no coração”, de ter um “vazio dentro de si”.

O ateu em geral também é invariavelmente condenado por ser muito racional. Eu mesmo já ouvi isso com a pior conotação possível. “Ah, mas você é muito racional, nunca será feliz assim”. Já deveria estar acostumado, mas ainda me impressiono quando ouço alguém criticar a racionalidade e dar-lhe um sentido negativo. Bom, parece que os religiosos não entendem mesmo que, nós ateus, só conseguimos ser felizes em nossa racionalidade. É isso que nos traz paz. Nossa capacidade de separar o real do ilusório e ainda assim apreciar tudo o que a vida traz de belo.

Como se não bastasse o ateu, segundo pesquisas, figurar em primeiro lugar na lista de preconceitos, sendo colocado à frente dos negros, dos homossexuais, dos usuários de drogas e das prostitutas, ele ainda é considerado um ser revoltado, uma pessoa raivosa.
Somos divididos em estúpidos sub-grupos baseado na patética argumentação de que se você diz que não crê em deus você é ateu, mas se você não crê em deus e diz “porque” você não crê em deus você é neo-ateu. Brilhante né?

É claro que nunca vi grupos de ateus se reunindo para agredir homossexuais na Avenida Paulista ou na orla de Copacabana. Nunca vi também associações de ateus colocarem capuzes brancos e queimarem negros. Tão pouco vi ateus dizendo que quem não concorda com eles será torturado por toda a eternidade.

Mas dessa vez sou obrigado a concordar com os religiosos. Isso mesmo: NÓS ATEUS SOMOS REVOLTADOS! Pronto admito para quem quiser ouvir. Somos revoltados e pronto.

Somos revoltados porque existem professores de ciência de escolas públicas que ainda se recusam a ensinar a evolução, somos revoltados porque a Igreja Católica não admite o uso de preservativos em continentes como a África onde a Aids é uma doença endêmica, condenando milhares a morte por via indireta.

Somos revoltados, porque missionários espancam suas mulheres quase até a morte porque afirmam que é a vontade de deus que elas se submetam a seus maridos. Somos revoltados porque em países como a Índia, com seus néscios sistemas de castas, pessoas são doutrinadas para acreditar que sua pobreza é merecida e fruto do carma de vidas passadas onde foram ruins.

Somos revoltados porque até hoje pessoas são mortas e mutiladas na África por facões cegos bradados por padres católicos que acusam pessoas de bruxaria. E antes que perguntem: sim, isso acontece hoje, não estou falando da idade média não.

Somos revoltados porque pessoas são ensinadas a odiarem sua sexualidade sob pena de irem para o inferno. Somos revoltados porque mulheres são convencidas a não exercer sua feminilidade, mesmo que existam igrejas onde a poligamia masculina seja permitida. Igrejas onde as meninas são convencidas a se casarem contra a sua vontade para não serem cobradas em suas pós-vida.

Somos revoltados por ensinarem crianças a odiarem homossexuais, por as doutrinarem a reprimir a sua homossexualidade e a odiarem seus corpos. Somos revoltados por dizerem que se forem gays são doentes e precisam “de cura”.

Somos revoltados porque pais religiosos frequentemente expulsam seus filhos de casa por serem gays quando o certo, o “cristão” a se fazer, seria amar-los e acolher-los, assim como um tal de “Jesus” faria.

Somos revoltados porque humilham e agridem quem é diferente deles com uma mão enquanto na outra seguram algo que é chamado de o “bom livro”.

Somos revoltados porque obras de arte de valor inimaginável como os Budas de Bamiyan foram destruídas pelos Talibãs, por aversão à “idolatria”. Somos revoltados pela pratica monstruosa da infibulação, que consiste em mutilar o clitóris de meninas e mulheres a fim de frear-lhes a sexualidade, e isso tudo com fundamentação em interpretação teológica.

Somos revoltados com a teocracia islâmica onde um o simples desobedecer ao pai ou mero namoro fora do casamento e da religião é punível com açoitamento público e dependendo do caso até a pena de morte por apedrejamento.

Somos revoltados quando sabemos que crianças de 10 anos de idade são forçadas a casar por mero atendimento à crenças e costumes religiosos oriundos de uma época onde as pessoas defecavam no mesmo local em que comiam.

Somos revoltados porque aqui mesmo no Brasil, onde uma outra criança de 9 anos foi estuprada e engravidou e ter um aborto autorizado, ser comunicada que tanto os médicos que fizeram o procedimento, assim como a família que a permitiu, foram excomungados pela Igreja Católica. Somos revoltados também, porque essa mesma igreja Católica não teve essa mesma atitude para com o animal que praticou tal estupro e não o excomungou também. Ora, que pesagem é essa? Que mensagem é essa perpetuou?

Nós ateus nos revoltamos com o fato de que essa mesma Igreja Católica só reconheceu e se desculpou em 1992 pela injustiça que praticou com Galileu em 1663. Nos revoltamos porque 300 anos é muito tempo até se pedir desculpas.

Nós ateus ficamos revoltados quando vemos pessoas diariamente sendo roubadas e abusadas em sua fé por pastores que lhes passam a perna sem a menor piedade. Por larápios disfarçados de cordeiro com suas mansões na Flórida e seus aviões a jato.

Nós ateus ficamos revoltados quando ouvimos que forças sobrenaturais ou entidades atuam e produzem efeitos sobre um mundo natural, mas são totalmente invisíveis e indetectáveis nesse mesmo mundo natural.

Nós ateus ficamos revoltados quando religiosos nos afirmam que não podemos julgar ou discernir os atos ou omissões divinas faces às tragédias do cotidiano e dizer que deus é mal por isso, vez que nosso critério, por ser humano, é falho, quando esses mesmos religiosos, usam esse mesmo critério humano e falho, para dizer que deus é bom e justo.

Nós ateus somos revoltados vez que não aceitamos com passividade o fato da humanidade se matar de forma rotineira com base em livros sagrados contraditórios e sem nenhuma justificativa que os sustente a não ser a fé de quem os professa.

Nós ateus nos revoltamos quando assistimos aviões serem jogados a 500 KM por hora contra prédios. Nos revoltamos quando vemos cristãos matarem muçulmanos e muçulmanos matarem judeus em um loop de violência infinita em nome de um deus que nunca apareceu nem para um cafezinho.

Nós ateus nos revoltamos sim. E temos orgulho dessa revolta. Temos orgulho de propagarmos o pensamento crítico, o embasamento científico doa a quem doer. Temos orgulho de colocar o dedo na ferida. Temos orgulho de dizer que todos que afirmam suas certezas deveriam ter a obrigação de demonstrar-las com evidências ao invés de empurrar a sujeira para baixo do tapete.

Nós ateus temos vergonha quando religiosos aduzem que a terra foi feita para eles quando sabemos que somos apenas poeira estelar e que a humanidade é um mero piscar de olhos na vastidão do tempo e do espaço.

Nós ateus ficamos revoltados quando religiosos nos chamam de radicais e intolerantes por dizermos: “nós não concordamos com vocês”, “que evidências vocês tem para corroborar o que afirmam”.

Nós ateus nos revoltamos quando religiosos querem tentam passar a imagem de que a revolta ateísta pela religião ocorra não pela religião em si e suas mazelas de clareza meridiana, mas sim porque há algo de errado conosco.

Mas sobretudo, nós ateus nos revoltamos, porque vocês religiosos não se revoltam. Porque não se indignam com tudo o que acontece ao redor do mundo em seu próprio país nas bem nas suas barbas. Que legado deixarão para seus filhos? Um país baseado nas ideias da bancada evangélica? É isso mesmo!?!?! Que não reclamem depois!

Por derradeiro que fique claro que, enquanto essas injustiças forem praticadas, esse tapa na cara do bom senso e da postura intelectualmente mais correta continuar, vocês religiosos terão que lidar com esses “ateus revoltados”.

Esses mesmos ateus revoltados que, durante muitos séculos e até nos dias de hoje, foram e são, perseguidos torturados e mortos. Esses ateus revoltados que, ao longo da história, contribuíram para que a ilusão nunca sobrepujasse a razão. Que trabalharam incessantemente para entregar maravilhas científicas. Que de forma inelutável sangraram para que o ser humano fosse reconhecido por sua mortalidade, falibilidade e racionalidade e ainda assim fosse imprescindível. Termino lembrando o belo questionamento de Douglas Adams: Será que não é o bastante ver que um jardim é bonito sem acreditar que ha fadas escondidas nele?”. Penso que sim…e vocês?

Humberto P. Charles"

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Contos suiços 2

Duas brasileiras...

(irritantemente inaudivel)
-Oi... lembra de mim?

-Não, eu deveria?
-Eu estive aqui duas vezes há uns seis meses atrás.
-Ah, deve ser por isso, é muito tempo e recebo muita gente aqui.
(risinhos)
-Você ia voltar pro Brasil, não?
-Pois é, eu voltei... mas resolvi voltar de novo.
(ri de novo sem se dar conta que ninguém acha graça)
-Mas... sabe... é que sou arquiteta de interiores, vim pra cá há uns anos estudar Feng Chui... acabei descobrindo o meu 'eu' interior, minha vida se transformou aqui como eu nunca imaginei... é quase parte do que sou.
-Hm... bom saber. Mas você queria voltar para o Brasil, não?
-É, por causa da família... você sabe, saudades e tal.
-Mas então?
-Então eu fui, fiquei lá um pouco e precisava voltar. Percebi que não era completa lá.
-Desculpa, não entendi... onde você se sente bem.
-Lá e aqui... lá eu tenho amizades, amigos. Também aproveitei para ir até o Planalto Central e meditar à espera dos discos voadores que têm aterrizado lá.
-Viu algum?!
-Não... mas comprei esse chaveiro, não é uma gracinha?
-... Tá, mas tava falando que tá de volta...?
-Ah, sim... eu precisava de espaço.
-Mais espaço que no Brasil daquele tamanho?
-Ah, mas é que a energia lá não tava boa, sabe... as coisas são assim pra mim, quando é pra ser, não tem jeito.
-Mas e voltou porque, mulher...? Parece tão triste...
-Ah, você percebeu?
(fingindo mal uma surpresa)
-Nada não... eu sou assim. Acabou que não vim direto... parei na França por dois meses. Quis ver onde o Kardec viveu, mas me perdi...
-Que Kardec? Allan Kardec?
-É, eu gosto de estar em contato com pessoas de bons fluídos... mas como eu falava, me perdi naquela droga de cidade, aí resolvi: "vou pra Inglaterra". E fui.
-Londres?
-Não, aquela cidade é horrorosa. Fui para uma cidadezinha do interior, linda, onde teve alguns pousos confirmados.
-Pousos?
-É, ficaram conhecidos como círculos nos campos de trigo...
-Mas isso deu na tevê; dois rapazes que fizeram.
-Nããoo...!! Isso é para as pessoas não se apavorarem.
(se curva na direção da outra e sussurra)
-Sabia que eles estão me observando?
-...
-Não olha agora, mas aquela máquina de café no outro lado da rua é um deles.
-... Mas... (engole em seco e tenta reconduzir a conversa) você falava que aqui é que se encontrou?
-Simm! Adoro isso aqui. Mas as vezes é tão triste, sabe...?
-O que?
-Assim, viver longe do Brasil...
-Mas você tem de se decidir. Lá ou cá.
-Mas eu gosto dos dois, e não consigo decidir.
(faz uma pausa rápida e volta a cochichar)
-O que foi isso?
-Isso o que? Tá me assustando...
-Não ouviu?
-Não...
-Deixa pra lá, deve ser só o vento.
-Não tem vento.
-Não? Hm... Acho que eu vou indo então.
-Claro, apareça sempre.
-Porque?
-... Como assim? Porque você é bem vinda aqui.
-E porque não seria?? Quem é você??
-Eu?
-Onde está a Maria?
-Aqui nunca teve Maria nenhuma.
-Bom, quando ela aparecer, diz que eu mandei lembranças.
-Tá, beijinho, querida.
-Tchau...
(assim que ela sai, a outra corre e fecha a porta. Se senta pra respirar e ouve a batida no vidro atrás de si. Olha assustada e de sobressalto vê a outra com o rosto colado no vidro a poucos centímetros dela)
-Aí!!! Que susto!
(com voz abafada e quase chorando)
-Quer tomar um café comigo?
-Não posso! Vou trabalhar agora.
-Tudo bem, eu volto amanhã.
-Claro.
-Sabe, acho que vou pra China ver a muralha...
(e vira as costas sem parar de falar e caminha até a outra perdê-la de vista na neve).

...

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O fantasma da palavra "aborto".

É com certo enfado que acompanho as discussões fomentadas pelas declarações recentes da ministra da Secretaria de Política para Mulheres, Eleonora Meniccuci, favorável à descriminalização do aborto. Basta uma palavra sobre o tema e recomeça os gritos e vaias dos que simplesmente não querem ouvir, com uma maturidade comparável à uma criança de seis anos. E seus porta-vozes são, como sempre, aqueles que muitas vezes deveriam estar calados. É o caso de Dom José Beneditino Simão, bispo de Assis e integrante da CNBB católica. Não contente por ter passado para a história como um sacerdote delirante ao imprimir panfletos alucinados afirmando que Lula era o novo Herodes em 2010, ele agora é notícia com o comentário de uma fineza impar sobre a ministra Meniccuci: "infeliz, mal-amada e irresponsável". Aparentemente, ele baseou seu comportamento no ensinamento dado pelo próprio cristo, que tratou com fineza igual sua mãe em João 2,4.

O fato é que algumas perguntas, para o terror e confusão de alguns segmentos da sociedade, requerem respostas que não podem ser resumidas em sim ou não. É por isso que quando a pergunta "você é a favor do aborto?" é feita, eu já sei que a pessoa não tem a mínima condição de entender a questão, especialmente colocando-a já sob uma pergunta capciosa. Isso porque a onda new age dos que se dizem contra o aborto (aborto é crime, eles avisam!), partem do princípio que a vida se origina na fecundação, ou como eles gostam de chamar, na concepção. De onde tiraram isso é que ninguém sabe. Nem eles, na verdade, porque basta apertar um pouco e a pérola "ah, mas é o que eu acredito" surge clara como o dia.

Quem diz que a vida começa na fecundação dormiu na aula de biologia. Simples assim. Não há nada evidência alguma fora da especulação causada pelo falatório que garanta isso. A fecundação é feita por duas células reprodutoras cujo pré-requisito necessário é que estejam (surpresa) vivas! Os espermatozóides percorrem um grande trajeto (para eles, claro) até o óvulo formando... uma terceira célula. Essa, por sua vez inicia um processo de divisão interna de células que, a priori, estão tão vivas quanto àquelas que a geraram. É verdade que isso causa um certo desconforto patético aos que querem avidamente fixar um ponto onde a alma é instalada como um programa no casulo em formação.

A vida assim não pode ter começo; ela não inicia de um ponto específico. Isso está fartamente demonstrado por uma série de procedimentos e experimentos. Ela é um processo contínuo de um ser vivo ao outro de transmissão genética. Tem sido assim por gerações, independente se alguns de nós entendem o processo ou não. Da mesma forma, o sol nunca girou ao redor da terra, sempre foi o contrário, embora até pouco tempo todos acreditassem nisso.

Esse conhecimento coloca uma série de questões sob um novo ponto de vista em relação ao aborto; se a vida não "começa" num ponto exato, então espere um pouco... a menstruação mensal das mulheres é um aborto também!! E a masturbação masculina então... um verdadeiro genocídio!!! Esse pensamento paranóico demonstra como a visão dos que não detém conhecimento para o que alegam é falho e superficial.

Sem o tabu social imposto sem reflexão, o processo de interrupção da gravidez pode ter uma discussão mais sadia e sensata. Antes de mais nada, que fique claro, se tem alguém que realmente sofre com o aborto, esse alguém é a gestante que o pratica. Mas claro, a imagem dos que tem os ouvidos vedados a esses argumentam preferem pintá-las no seu imaginário assim:

 Retirei essa imagem e a traduzi livremente daqui. O site em questão se chama pelo direito de decidir

E depois, uma coisa que aparentemente (ou convenientemente) as pessoas que condenam indiscrinadamente essa prática não querem ver é que descriminalizar o aborto não significa que as pessoas serão obrigadas a fazê-lo, nem que está simplesmente liberado para todos. É muita ingenuidade, especialmente das pessoas que lidam com saúde pública e pensam assim, achar que a questão se resolve nisso. A decisão de interromper a gravidez não é fácil, deixa sequelas e com certeza necessita de apoio psicológico para que seja feita. O que essas pessoas não enxergam é que essa criminalização sem sentido (já que a vida não começa num ponto específico, mas é um fluxo contínuo) é que essa situação força o grande número de abortos clandestinos, feitos em clínicas suspeitas, quando não em casa, com agulhas de tricô, por exemplo.

A verdade é que não me cabe decidir se fulana ou beltrana podem ou não interromper a gravidez. O corpo é dela, ela sobretudo e talvez os seus próximos é que devem decidir isso. Porque nada é mais terno que uma criança recém nascida, mas nada é mais deprimente que uma mulher com oito filhos sem poder sustentar a si própria. Ou só com um, mas indesejado. Afinal, a questão não se resume entre os humildes de posses. Quantas famílias eu conheci com aquele ranço velado de uma gravidez que teve, obrigatoriamente que seguir seu curso; de pais que não se separaram ainda por causa desses filhos, daqueles para quem o relacionamento estava no começo e não tinha chance de prosperar, mas aí surge um filho indesejado que mudaria do avesso a vida deles até o fim. A amargura, o ressentimento, a sensação de culpa que algumas dessas pessoas devem sentir quando pensam que talvez tivesse sido melhor interromper a gravidez, mas que desejar isso faz dela uma criminosa e imoral aos olhos dos formadores de opinião atuais.

Não tenho dúvidas que provavelmente muitas dessas mulheres optarão por ter essas crianças com sérias propensões à marginalidade social nessas condições. Mas para aquelas que desejarem a interrupção da gravidez, com o acompanhamento certo, em condições médicas seguras,  como eu, da minha casa confortável e aquecida, mesa farta e  filhos criados, mas acima de tudo, sem ter absolutamente nada a ver com a vida de quem quer que seja, posso lhe condenar? 
     

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Ligando alguns pontos.....

Como tantas vezes afirmei aqui, uma coisa são os fatos em si, outra sua interpretação. Criar um link entre fatos aparentemente independentes justapondo-os em um panorama mais amplo, que não só ajuda a explicá-los como também contribui a uma compreensão em níveis mais profundos do mundo em que vivemos é uma tarefa nobre, embora deva ser embasada em argumentos convincentes. Algumas vezes, esses fatos me aparecem casualmente, e quando menos espero, o lampejo da conexão enter eles se estabelece. Um exemplo?

Vi de relance um link de notícias que falava sobre a liderança da rede Record de tv sobre a Rede Globo, tudo por conta de um seriado sobre Davi... no caso em questão, não o meu nobre amigo trompista pernambucano que está em Salvador-BA, mas o rei bíblico. Há nesses números, claro, aqueles que já abandonaram a audiência servil da rede criada por Roberto Marinho; mas esses, desconfio, tampouco dariam Ibope à Record. Alguns dos comentários que li rapidamente demonstram bem que essa liderança foi obtida porque acertaram em cheio um filão de religiosos evangélicos, que rapidamente abandonam a novela quando o assunto é a bíblia. 

Cansados de perder os lucros exorbitantes com as vendas de cds por conta da internet e dos piratas, empresas como a Som Livre passaram a mirar nesse mesmo público, já que, como se sabe, eles não fazem download dos cds, mas os obtém diretamente nas igrejas. Lucro na certa. E a Globo, da qual a Som Livre faz parte, caiu pra dentro anunciando um festival Gospel no fim do ano passado (que vários amigos meus do curso relataram como um dos eventos mais desafinados dos últimos tempos, musicalmente falando, claro). Além disso, incluíram a cantora Aline Barros, um dos ícones desse nicho no especial de fim de ano da emissora carioca, e o nome de jesus figurou estranhamente entre pagodes e axés, sem nenhuma manifestação de incongruencia aparente.

A mesma Globo, aliás, mostrou com certo ar de otimismo a queda dos diversos governantes que viviam em regimes ditatoriais no norte da África e Oriente Médio, no evento conhecido como primavera árabe. Acontece que os ditadores em questão foram ou estão sendo rapidamente substituídos por líderes religiosos fanáticos, e o fato é que ninguém sabe onde vai parar; e nem se estávamos na panela antes e agora fomos para o fogo ou o contrário. 

E aqui eu arremato pra dizer que esses eventos são didáticos para demonstrar que quando uma ditadura se vai, é preciso estar atento para não cair em outra. Os contra-a-Globo comemoram a sua aparente fragilidade, mas esquecem que o que vem no lugar é uma rede cujos recursos parecem infinitos, e na prática trazem o embrião que tem brotado das formas mais bizarras, como os trízimos, as canetas abençoadas para concursos e as promessas de curas impossíveis e falsas relações de causalidade entre tragédias e comportamentos.

Essa fé cega que se manifesta na comemoração vibrante que seus seguidores fazem a cada aparição pública do nome de seu deus, ou no aumento do número de fiéis como se estivessem num placar pode parecer ingênua e sem propósito, mas não é. Toda religião e por extensão boa parte dos religiosos (e até não religiosos) são unânimes em pedir liberdade de crenças. Mas, se deixadas por sua própria conta, esses movimentos tendem a tentar dominar o ambiente social em que se encontram. Isso porque a quem se considera ungido, abençoado, um militante das causas divinas, não basta apenas que ele acredite ou siga esses ou aqueles preceitos. É preciso que a pseudo vitória total sobre todos os outros seja sua ou da sua igreja, o que dá no mesmo; que no fim, promessas que nada tem de originais e que lhe chegam por centésima mão por manuscritos e reimpressões que foram feitas a pastores e camponeses na Era do Ferro se cumpram, e que então os pseudo justos sejam elevados, o que quer que isso signifique. 

Estou convencido que a natureza do processo religioso é naturalmente seletiva, segregacionista e por isso mesmo, profundamente prejudical ao nosso desenvolvimento como espécie. Católicos criticam evangélicos, que abominam espiritas, e todos juntos odeiam até o último centavo os praticantes de candomblé. E assim por diante. Claro que a liberdade de credo só pode ser garantida por uma entidde independente, de fora desse contexto, para quem não importa o que ou no que você crê, mas sim o que você faz.


Por isso o estado laico é tão importante. Tire isso, e a derrocada de uma rede tradicionalmente sensacionalista como a rede Globo pelo fanatismo dos que vendem canetas Bic como item sagrado troca seis por meia dúzia. Da mesma forma, o apego cego que essas pessoas devotam ao professarem sua fé no imaginário dá a quem controla ou materializa esse imaginário no mundo poderes incalculáveis. Mais um deputado de jesus, e todos aplaudem. Mais uma rede para glória de jesus, idem. E quando tudo estiver cercado, os tais caídos e humilhados serão uma multidão ensandecida, que aprendeu que é certo controlar a vida do outro; que todos devem viver sob as regras biblicas e renderem graças ao seu amigo imaginário, não importa que se diga que vivemos num mundo livre, porque então, a palavra liberdade não terá qualquer sentido. E para espanto dos menos perspcazes, eles farão isso sequer se comoverem, porque acreditam estar certos, e pronto.

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Seremos então uma única nação em cristo, sem ou com uma ciência tão deturpada porque contradiz a bíblia que não terá validade alguma; impedidos de navegar sobre os mares à luz do sol da razão que duramente conquistamos por conta dessas caravelas que preferem viajar sob os nevoeiros sem ver o que está à sua frente. E a cada nau perdida na colisão com os rochedos, uma prece e um aceno, e a conveniente atitude de ovelhas sob o comando do pastor; condenando assim todos nós ao ostracismo.

Não é possível, não nesses dias em que tanto sabemos sobre o que fazemos e onde estamos, que as opiniões dos crédulos impeça a liberdade individual. Cada um de nós que nasce carrega a herança de gerações e gerações de pessoas que como nós, que lutaram, venceram e foram vencidos, mas sobretudo triunfaram sobre seus medos, ou não estaríamos aqui.
É preciso que aprendamos com nosso passado e projetemos a partir desse aprendizado o nosso futuro.



Sinais europeus...

Acompanho de longe (embora não tanto agora) a situação espanhola atual. Em meio à ruína econômica que assola o país, não falta quem diga que o acesso para o caos já era nítido há algum tempo. A forma absurda com a qual o sitema de controle aeroportuário barrava brasileiros de forma completamente arbitrária é um dos pontos chaves para entender o processo. Diariamente, acompanho no noticiário a frequencia assustadora de depoimentos desses brasileiros que demonstram mesmo o uso da força desnecessária, dos quais o caso do violonista e compositor Guinga não é uma das exceções, infelizmente.

Uma sociedade secular, que já foi um dos grandes centros de transmissão cultural do mundo, obviamente não cai por acaso. Para isso, normalmente contribuem o desleixo do poder público com suas obrigações mais básicas, introduzindo o descaso geral como norma. Aos poucos, esses descaso leva ao cada um por si, chegando às raias do desespero quando, numa tentativa de conter a entrada de imigrantes ilegais, chega-se ao cúmulo de nivelar por baixo toda uma nação e seus cidadãos.

Mas a Espanha dá outros sinais externos disso, ao demonstrar que seu sistema judiciário também ameaça desabar. É largamente criticado atualmente o afastamento por incríveis onze anos de Baltazar Galzón, um dos juízes que mais promoveu limpezas dentre os torturadores e evasores de divisas; em outras palavras, exatamente o tipo de pessoa que levou o país ao ponto em que se encontra. Ao condenar o magistrado que ficou famoso por levar o ditador Pinochet aos tribunais, a mensagem que transpassa é de que a justiça como tal já é passado naquele país.

Conheci uma argentina que vivia na Espanha por doze anos. De uma hora pra outra, sem emprego, sem ter onde ir. Como ela, venho conhecendo muitos outros, italianos, turcos, portugueses; viajantes, nômades em sua própria terra, em busca de emprego, de uma vida decente e feliz. O rosto de todos se ilumina quando peço detalhes da sua terra natal, mas o brilho rapidamente se esvai. Só reascende quando falo do Brasil, de como estamos indo, de como lentamente, depois de anos de uma política irresponsável que quase dilapidou nosso patrimonio, parece que estamos relativamente mais coesos do que jamais fomos como nação.

E como deve ter ocorrido em outros tempos, percebo nesse interesse pelo nosso país um eco de um passado não tão distante, em que outros europeus em semelhante estado buscavam melhor sorte num lugar que julgavam quase selvagem, mas rico em oportunidades.